sexta-feira, 20 de março de 2009

tempo eu

Engraçado que, disso tudo, só fica a sensação.
A sensação de um futuro que viria a ser.

Me foge a imagem.
Me escapam os enganos.

É apenas a saudade que me ensurdece.
São os sentidos que invadem meus cantos.
E as palavras.

Mas o toque se esvai.
A espera já não existe.

Porque já não há mais tempo.

As sensações fluem,
sem sucessão.

E sou eu que passo,
sem perceber.
Aos poucos, estou liberando meu cais. Estou soltando, com certa cautela, alguns dos meus mais seguros barcos. Aqueles mais bem construídos. Aqueles que, acredito eu, aguentaríam alguma tempestade.
Apesar de ter consultado as previsões também. Não iria tanto na levada da maré.
Algumas outras embarcações menores, mais frágeis, estão loucas para se aventurar. Para provar que estão seguras.
Estou estudando o caso.
Já meus milhares de botes, minhas bóias salva-vidas, já se perderam. Atracaram, talvez, em teu cais.
E já esperam por mim.

Crítica

O Gabriel dizia
"sei lá".
Aliás, ele sempre diz tudo. Tudo o que você não quer ouvir e precisa falar.
Ele canta os meus males e me espanta.

Eu gosto dele. Gosto da sua sinceridade.
Com um "sei lá" ele diz precisamente tudo o que está entre suas garras e suas possibilidades. Entre suas rédeas e seus rodeios.

E eu também não sei.
Mas meu campo é mais vasto.
A linha do meu horizonte termina aonde começa.
Não tem fim.

sexta-feira, 6 de março de 2009

Tática

Por via das duvidas, vou jogar pelos dois lados. Pra não deixar brechas.
Vou continuar te amando, pra não acabar com os sonhos nem com a graça.
E vou continuar te esquecendo, pro caso do destino resolver aprontar e só te trazer pra mim quando eu já tiver te esquecido.

terça-feira, 3 de março de 2009

da janela

cada lâmpada acesa é uma esperança
o paletó vira gente
o balde vira rosto
o silêncio, conjunção de desejos

porque quando estamos a procura de alguém
tudo que é concreto ganha corpo
tudo que é tijolo ganha massa
e cada vidro embaça todas as possibilidades que queremos ter
ou que podemos ter

cada cobertura arranha um céu
e o freio no asfalto grita tudo aquilo que dói ouvir
a nuvem que passa, só passa
e quem chora é você

porque quando estamos a procura de um certo alguém
tudo o que está, só é se for em dois
tudo o que se sente, só fica se se consente
e todas as possibilidades fecham suas cortinas



(enquanto os quadrados perguntam inquietos: e você, no que pensa?)